Sobre potes, tupperware e saudade pra viagem

Sobre potes, tupperware e saudade pra viagem

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Não tinha uma festa em casa que não acabasse em orgia de potes. Potes de plástico, de vidro, que tinham experiência como embalagem de sorvete, margarina, azeitona, maionese. Tudo era reaproveitado, iam e vinham cumprindo a missão assumida nessa encarnação: levar o que sobrou da festa.

Gosto demais de potes e percebi a tendência acumuladora que se esconde meio tímida no armário debaixo da pia. Imagina que vou jogar fora vidro de palmito! E esse pote de geleia, deve dar um bom guarda-trecos. Que bonita a latinha de chá, pecado ir pro lixo! Guardo tudo. E não há espaço para arrependimentos.

Dizem que mãe perdoa dívida de dinheiro, mas nunca um tapoué não devolvido. Acho que é certa a afirmação. Pedi uma vez pra minha mãe um pote de vidro quadrado – herança da minha tia – e ela não quis me emprestar porque tinha valor sentimental e eu poderia quebrar. Logo eu, delicada que nem coice de mula. Deu bafafá, me indignei. Peguei à força e escapei dos olhos da mãe feito MacGyver. O pote é de vidro grosso, faz um barulho sério quando recebe a tampa. O som que fazia o fim de domingo da minha tia. Ele vinha pra casa protegendo umas asinhas de frango frias com macarrão vermelho para a segunda-feira.

Compro uns palmitos bons no Sam’s Club, vêm sempre em dois. Potes bonitos, design massa. Uso pra chacoalhar o whey de manhã, uma coisa ridícula, sei. Mas só salvei um, os outros, depois de fazerem montanha no armarinho debaixo da pia, foram pra reciclagem. Missão cumprida, soldados.

Na prateleira, guardo os chás em potes de vidro. Pequenininhos para os cravos, grandões para folhas de maracujá e chá preto. Parece armário de bruxa, tem que ver.

Minha tia guardava muitos potes e quando ela morreu não vencia tirar coisas dos armários. Dorianas empilhadas desde a década anterior, Kibons dois litros amontoados em todas as fases – brancos, vermelhos e azuis, Maionneg’s, Hellmans, Coca-Colas, Cica. Coleção museológica da indústria alimentícia brasileira.

Sobra sempre a casca das coisas. E elas levam e trazem as sobras da gente. Bonito e triste isso.

Tento hoje não acumular, mas é difícil, sinto um quentinho no coração quando vejo um pote ou um desses vidros que parecem espernear para não serem jogados no lixo. Tem comportamentos que a gente reproduz e só entende na hora que lê um Jung, ou faz uma constelação familiar, ou leva um pito do namorado mesmo.

Vixe, tenho que devolver o tuppeware original da sogra, o do bolo de banana. Diz minha mãe que só se devolve um tapoué que veio com comida com outra comida, regra familiar. Vou ver que receita impressionaria nesse pote. Deus me livre ficar mal falada na família.

Tem gente mais profissional no assunto.

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