O que é que essa linguiça tem?

O que é que essa linguiça tem?

- em Comer, Matérias, Reviews
Álvaro Veronez | Foto: Fran Micheli

A 20 e poucos minutos de Ribeirão Preto, Dumont conserva a atmosfera de cidadezinha interiorana com cheiros e paisagens tranquilas entre as ruas e os canaviais que circundam a cidade. Chegamos lá à procura de Álvaro Veronez, um dos nomes pioneiros por trás da famosa linguiça de Dumont.

A fazenda Albertina, onde fica a sede da Casa Veronezi – principal produtora de linguiças artesanais – é um passeio à parte em meio à natureza generosa. Tem até uma pequena pousada improvisada para receber os peregrinos que viajam pela região em nome da fé.

A história

Os Veronezi (ou Veronez, dependendo da boa vontade do cartório que registrou cada membro da família), avós de Álvaro, chegaram à região na metade do século XX. Compraram terras e ali começaram se dedicar à agricultura, como tantos outros milhares de imigrantes italianos que buscavam no Brasil um recomeço para suas vidas.

Na época, sem energia elétrica, a agricultura e a criação de porcos era o que provia o sustento da família. A abundância de carne e vegetais era grande, porém a falta de energia elétrica era um problema na hora de armazenar os alimentos. Foi aí que os avós de Álvaro passaram a moer as carnes e a armazená-las em tripas acima do fogão à lenha. Outras partes da carne eram conservadas na banha do porco para não estragarem.

“Lembro de comer aquelas linguiças frescas fritas na banha, sempre com pão. Outras eram deixadas para curar por mais tempo, aí comíamos como se fosse um salame”, lembra Álvaro, o neto que hoje cuida do legado da família.

A produção de linguiças era, no início, a maneira que os Veronezi encontraram de alimentar a família de 11 filhos. E então a vida se encarregou de pregar as suas peças.

“Como tínhamos maquinário de beneficiamento de arroz e outros equipamentos, vizinhos e pessoas da região começaram a vir para utilizá-los. Muitos chegavam na hora do almoço e sentiam o cheiro da linguiça que estava sendo preparada. Eu era pequeno, éramos uma família enorme nessa época, 30 pessoas à mesa todos os dias”. A linguiça, servida por educação às visitas, passou a ser vendida por insistência de quem provava.

Mesmo com mais de 70 anos de produção, foi só em 1980 que a empresa se instituiu. Até 20 anos atrás, a Casa Veronezi tinha sua própria criação de porcos com mais de 6 mil animais. A burocracia da vigilância sanitária fez com que a empresa passasse a comprar a carne de frigoríficos. Atualmente, a produção de linguiça utiliza carnes de um frigorífico da região e de outro, do sul.

O que ela tem de diferente?

A linguiça produzida na fazenda da Casa Veronezi não leva tanto toucinho como nas linguiças comuns. Nem conservantes, aromatizadores, químicos. É tudo feito artesanalmente com o pernil e outras partes nobres do porco. Por isso, se a linguiça não for consumida fresca em três dias, no máximo, precisa ser congelada.

Como controle de qualidade da carne que chega toda semana, Álvaro diz que tem um truque simples. Pega um pedaço da carne e a aquece. “Quando o porco não é castrado, ele solta um hormônio que tem um cheiro muito ruim. Se estiver assim, nós devolvemos, pegamos outro”, diz.

A fama das linguiças da Casa Veronezi foi a responsável por colocar Dumont no mapa gastronômico paulista. Com o tempo, outras famílias passaram a produzir embutidos e derivados de carne suína. “Hoje você pode me perguntar se eu como qualquer linguiça de Dumont. Não. Tem mais de 30 lugares que fabricam linguiça, mas muitos pegaram a oportunidade e não prezam pela qualidade”.

Para agradar a freguesia que não para de chegar, Álvaro já criou 40 receitas diferentes de linguiça e todas elas ainda estão à venda. Entre elas, a Linguiça Oriental, com gengibre, wasabi e shoyu, é uma das que mais saem. A receita foi criada pela esposa de Álvaro, Maria Cristina, que é descendente de japoneses. Tem também a Linguiça Árabe, com hortelã, trigo e manjericão e a Linguiça de Shimeji.

Álvaro conta que, há oito anos, apareceu em um programa de culinária da Globo e que, no mesmo dia, vendeu mais de 100 quilos da linguiça.

Onde encontrar?

Ficou com vontade de experimentar? Então é bom ficar atento. As linguiças legítimas da Casa Veronezi estão à venda em Ribeirão Preto em apenas quatro lugares:

Paulicéia

Vila Beef

Soft Beef

Premium Beef

Alguns bares e padarias também servem as linguiças prontas e em sanduíches, como Cervejaria Walfänger, Cervejarium, City Pão, Empório Santa Therezinha, Grand Steak e Doutor Linguiça.

Você também pode gostar

Chopeduto em Ribeirão Preto? Teve sim.

No texto “Ribeirão Preto e a cerveja: não