Antes de mais nada, vamos deixar uma moção de repúdio ao chato do chá que se impõe na conversa dizendo “mas isso aí nem é chá”. Agora, vamos entender porque essa polêmica roda no universo dos entendidos do assunto..
Por ter raízes indígenas, o Brasil é um país que aprendeu a tomar “chás de ervas” e, na maioria das vezes, eles estão sempre ligados à cura de algum problema. É chazinho pra que? Dor de dente, diarréia, insônia, pau mole, aflição?. Nós nos habituamos a ligar a bebida quente à base de ervas à doença e, pela lógica, qualquer bebida quente feita com plantas também seguiria com esse propósito.
O chá de verdade também ajuda em vários sentidos e falei sobre a relação dele com a minha ansiedade AQUI.
A origem do chá
Acontece que a palavra “chá” vem do do mandarin (ch’a) – idioma falado no norte da China -, enquanto “tea”, termo em inglês, veio de um dialeto do chinês (t”e). Ambas se referem à infusão de uma única planta nativa chinesa: a Camellia Sinensis. Portanto, no Oriente, berço da bebida ancestral, “chá” é a denominação exclusiva da bebida originária dessa planta aí.
O que acontece é que, depois que o chá (planta e bebida) chegou ao Ocidente, sendo difundido na Europa pelos portugueses no século XV, as pessoas passaram, gradativamente, a generalizar como “chá” qualquer bebida feita através da infusão, decocção ou extração de plantas diversas. Hoje, nos Estados Unidos, por exemplo, usa-se o termo “herbal tea” para explicar que a infusão é de plantas que não a Camellia Sinensis.
Isso quer dizer que o seu chazinho de hortelã, então, na verdade, é uma infusão (ou ainda tisana, outro termo aplicado à bebida feita a partir de folhas, caules, flores, etc). Chá, segundo a tradição e a história milenar, é só de Camellia Sinensis. Fizemos AQUI um guia pra te iniciar no assunto.
Por isso, cursos de formação profissional de especialistas em chás especiais, sommeliers ou tea connoisseurs, dão aos alunos o conhecimento básico necessário para trabalharem com a Camellia Sinensis.
A confusão regulatória no Brasil
Um fator que vai além da cultura e que ajuda nessa confusão em relação ao termo “chá” no Brasil é a regulamentação. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), responsável, entre outras coisas, pela liberação da comercialização, produção e importação de alimentos e bebidas, entende que é “chá” todos os vegetais utilizados para o preparo de bebida através da infusão em água. Bebidas prontas também entram no balaio, não importando se elas levam muito mais açúcar e aromatizante do que chá, propriamente.
Em 2005, por exemplo, foi aprovado o REGULAMENTO TÉCNICO DE ESPÉCIES VEGETAIS PARA O PREPARO DE CHÁS, documento oficial que sinaliza todas as plantas aprovadas nacionalmente para o preparo da bebida. Por essa situação, você encontra erva cidreira, hortelã, capim santo, camomila, erva-mate, entre tantas outras, vendidas como chá, tanto nas caixinhas de sachê industrializadas, quanto a granel nos mercadões da vida.
Mas, e aí, é chá ou não é?
Diante desse impasse, eu resumiria a coisa toda assim: ao estudar melhor a Camellia Sinensis e a história do chá, consideramos qualquer outra planta como infusão. Mas, de novo, longe de mim ser a polícia das bebidas quentes e dizer pra você parar de chamar camomila de chá. Afinal, a bebida é sua e você pode chamá-la do que quiser, mas é importante entender o porquê dessa polêmica toda e escolher que posição tomar diante do babalaô, certo?
Eu e muitos colegas da área ficamos no time do respeito máximo pela bebida milenar, considerando como “chá” somente o que vem da Camellia Sinensis. Mas, como dizia Raul Seixas, faça o que tu queres, pois é tudo da lei.
E tá tudo bem.