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Sobre plantações verticais e pequenas verduras

Plantações Verticais. Foto Aerofarms (divulgação)

Plantações Verticais. Foto Aerofarms (divulgação)

Cá estamos, para falar de comida. Gastronomia é uma palavra muito ampla. Não sei suas referências a respeito do assunto, mas não vamos falar sobre os pratos bonitos de chefs estrelados, nem divagar sobre as pequenas porções de ingredientes irreconhecíveis. Vamos, em princípio, focar em tecnologia e comida. Poderia dizer que é “apenas” isso, ou “simples assim”, mas cá entre nós, sabemos que essas duas palavras juntas na mesma frase, nunca poderão ser resumidas em resultados simplórios.

Se não sabemos, descobrimos agora, que a gastronomia é cheia de modas e tendências de épocas. Tivemos a nouvelle cuisine por volta de 1970, cheia de técnicas, empratamentos bonitões e chefs famosos, como Paul Bocuse e Jean Pierre Troisgros, que buscavam mudar a forma que os ingredientes eram utilizados. Temos os estilos de cozinha, as técnicas e o segundo ponto desta conversa: os ingredientes. Muitos lugares preferem trabalhar com a sazonalidade, outros preferem ter sempre os mesmos ingredientes à mão, mas independente desses fatores, os ingredientes são os bonitos que brilham nas mãos dos cozinheiros. E, falando em ingredientes, podemos falar de legumes, verduras e frutas e estender o papo para os orgânicos,  até mencionar os vegetarianos, mas quase nunca nos recordamos de imediato das plantações, da terra, ou da ausência dela.

Assim como temos a ideia da alta gastronomia ou de restaurantes estrelados, experiências que não fazem parte da rotina da maioria dos cozinheiros e amantes de comer, a possibilidade de criar a partir de tecnologia, luzes e hidroponia, em ambiente controlado, como ocorre nas plantações verticais, parece muito distante da nossa realidade.

As plantações verticais são construídas em ambientes fechados, como galpões, containers e até mesmo em estações de metrôs. Em Seul, desde 2019, na linha 7 do metrô da cidade, 30 kg de mais de 30 variedades de vegetais, legumes e verduras são produzidos diariamente, com temperatura monitorada, controle de pesticidas, métodos de crescimento e análises de dados: todo o esquema montado. Pelo hortifruti estar nesse ambiente mais vigiado que casas de reality shows, eles não têm contato com agrotóxicos, são orgânicos, visam à produção de alto valor nutricional, possuem riscos baixíssimos de contaminações e podem oferecer produtos frescos e de qualidade ao mercado local de centros urbanos. Uma grande maravilha! Mas eles também não crescem como estamos acostumados a ver nas feiras brasileiras: aquela alface que mal cabe na ecobag. Lá nas plantações controladas não é muito bem assim que funciona, o hortifruti não cresce do tamanho que normalmente compramos no mercado, eles ficam um pouco menores, ou como vamos chamar aqui: babys legumes e verduras.

Em um artigo publicado pela Nature, revista britânica de estudos científicos, um grupo de pesquisadores aborda de forma técnica o assunto, explorando vários estudos anteriores, os aspectos morfológicos, econômicos, sociais e de desenvolvimento desses tipos de plantações e os impactos positivos que elas podem oferecer, tanto para o consumidor como para o mercado. Não posso concluir se é mais por uma questão de oferta de mercado ou por aspectos fisiológicos da exposição desses vegetais às condições de luz, água e nutrientes, que os legumes são produzidos na versão baby.

O argumento apresentado no artigo, que pode de alguma forma embasar toda essa discussão sobre o assunto, é o de que durante fases de crescimento das verduras e legumes, níveis de nutrientes e exposição à luz, “são alterados de maximizar o crescimento para maximizar a qualidade” (2021)*. É levantando o ponto de que a exposição dos legumes e verduras à iluminação e o tipo de luz usados, são fatores determinantes nos resultados nutricionais e visuais do produto. Mas é um tanto quanto curioso, abrir os sites de várias plantações verticais no mundo, sobretudo na Ásia e Estados Unidos e se deparar com uma grande gama de variedades de legumes e verduras na versão pequena.

Existem investimentos no exterior, principalmente na União Europeia, Ásia e  Estados Unidos, em pesquisas e desenvolvimento a respeito das plantações verticais. Nos Estados Unidos, por exemplo, o governo investiu US $2 milhões como incentivo ao desenvolvimento e criação de políticas para o setor de “plantações urbanas, indoor, e outros tipos de agriculturas emergentes” . Será que esse panorama, da produção de leguminhos pode criar uma nova tendência de consumo e afetar a nossa forma de comprar de legumes e verduras no futuro?

Penso que a produção desses formatos menores de leguminhos pode influenciar na forma que consumimos e na forma que os ingredientes são trabalhados nas cozinhas dos restaurantes, criando até uma nova tendência de consumo. É só entrar no site de uma das maiores fazendas verticais nos Estados Unidos, a Aerofarms ou na grande Sul Coreana, Farm 8, para ver que eles vendem tudo na versão baby. Baby rúcula, baby pimentões, babys alfaces, babys quiabos… Igual aquelas lojas japonesas baseadas na cultura kawaii, em que tudo parece ser feito na versão mini. No caso desses legumes pequenos, uma mistura de elegância com uma linha tênue para tirar um “awwn” de fofura dos consumidores.

Baby cenouras, baby folhas, baby tomates, todas as mais possíveis variedades de babys, orgânicos e prontinhos para caberem perfeitamente no empratamento dos restaurantes finos, nas marmitas e até mesmo nos pacotes de snacks. Uma alimentação saudável e rápida. Coma um baby legume. É uma manchete de mão cheia para os trend hunters de gastronomia.

Serão os babys legumes e verduras os novos queridinhos da gastronomia? Espero que em algum momento as plantações verticais ganhem a aceitação ampla no mercado, mas até lá, será que veremos os babys quiabos entrando nas cozinhas de restaurantes e sendo vistos como a nova revolução em como consumimos comida?

Fica aqui a minha mais sincera ansiedade de ver as plantações verticais ganhando força, recebendo investimentos, influenciando o mercado da gastronomia de tendências e futuramente podendo atingir de forma positiva e eficiente – sem se tornar uma tendência fora da realidade- a produção de grande quantidade de alimentos saudáveis para quem tem fome. A possibilidade de crescer – ou crescer parcialmente – alimentos em grandes centros de forma orgânica é suculenta e gosto de  acreditar que as plantações no meio de São Paulo em galpões abandonados,  irão tornar-se realidade, não apenas para os chefs, mas para a população.

 

REFERÊNCIAS: 

* (citação) Therefore, the concept of end-of-production treatments was developed36, where during the last days of cultivation, factors such as PPFD, light spectrum and nutrient solution composition are changed from maximizing growth to maximizing quality.

Artigo da Nature: LINK AQUI

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