Adicionar sal, copo quadrado, regras para beber: Celso Ishiy derruba os mitos do sake

Adicionar sal, copo quadrado, regras para beber: Celso Ishiy derruba os mitos do sake

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Especialista em sake, Celso Ishiy, fala sobre o simbolismo que envolve a bebida até hoje e indica como começar a mergulhar no universo do sake

Produzido com água, arroz e um fungo específico, o sake é uma bebida japonesa milenar que ainda hoje é ligada a tradições e arrasta em sua história muitos simbolismos. Mesmo ainda longe de ter a popularidade da cerveja ou da cachaça, o sake vem encontrando um público fiel e sedento por qualidade no Brasil.

Entre janeiro e setembro de 2021 o Brasil, por exemplo, importou 192.000 litros do Japão. Enquanto isso, a Itália comprou 236 000 litros de lá, mostrando que os brasileiros ainda estão construindo um relacionamento com a bebida. E muito disso deve-se às “sakeritas”, drinks adaptados com sake e frutas que estrelam o cardápio de bares e restaurantes e à curiosidade crescente por bebidas fermentadas.

Para entender melhor sobre essa obra-prima da fermentação e saber mais sobre formas de consumo, curiosidades e história, batemos um papo com Celso Ishiy, sommelier de sakes e um dos maiores especialistas da bebida no Brasil. Ele é também autor do Guia Prático do Sake, livro à venda AQUI.

Barris de sake | Foto: Bia Amorim

FM – Qual a melhor forma de entrar para o universo do sake? Quais rótulos devo provar, quais características procurar?
CI – É necessário conhecer os sakes japoneses, pois ainda não é como o vinho, que tem vários rótulos e tipos bons de diversos países. Ainda é só no Japão que pode-se encontrar variedades de sakes de qualidade. Para começar, sempre sugiro iniciar pelos mais simples e ir evoluindo para os super premiums, pois se iniciar pelos melhores, talvez não valorize todas suas características.

Existem sakes doces, secos, encorpados, suaves, aromáticos, aí depende muito também de preferência pessoal.

FM – O que nunca se deve fazer com a bebida?
CI – Dizem que, às vezes, o vinho tem tantas regras que as pessoas ficam com vergonha de tomá-lo em público com medo de cometer uma gafe. No caso do sake, como tem essa identidade de sagrado, de felicidade, o ideal é tomar da maneira que te faz mais feliz, afinal esse é o objetivo do sake que vai além da parte técnica dele.

FM – Como identificar um bom sake e o sake de qualidade duvidosa?
CI – Realmente, existem milhares de sakes bons! Vindo do Japão, existe um controle rígido por parte do governo para seguir todas as regras para produção de sake. Já fora, não existe esse padrão. Sake não tem validade se bem conservado, mas o ideal seria o mais próximo da data de fabricação, pois ele terá oxidado menos. Se ele estiver com coloração muito amarelada é porque o sake ficou exposto à luz e calor e oxidou e deve ter um sabor mais amargo.

Sake harmonizado com sushis do restaurante Mirai | Foto: Bia Amorim

FM – Existe algum ritual para beber sake?
CI – Depende da ocasião. Para casamentos no Japão existe um ritual próprio de beber o sake em etapas. Mas, em ocasiões de jantar ou eventos, é comum a pessoa hierarquicamente inferior servir os superiores, ou o mais novo servir os mais velhos. A pessoa que serve segura a garrafa com as 2 mãos e a pessoa que recebe segura a taça ou copo com as 2 mãos, pois naquele momento não tem nada mais importante do que dar atenção ao sake.

Para o brinde, existe a palavra “kampai” que, em japonês arcaico, significa “copo seco”. Na época, tomava-se sake naqueles copos pequenos e as pessoas falavam kampai, bebiam tudo e deixavam o copo seco na mesa.

FM – Quais harmonizações básicas você indicaria para um iniciante?
CI – O sake, ao contrario do vinho, não é tão seco ou tão doce. Assim como a gastronomia japonesa menos “temperada” e mais suave, o sake segue essa linha, então um sake doce ou seco pode harmonizar muito bem dependendo de seu gosto pessoal. Escolha seu prato preferido da culinária e vá testando para descobrir seu gosto com sake. Normalmente, sushis e sashimis com sakes premiums costumam ser um ótimo começo.

FM – Quais são os mitos mais difundidos sobre sake que você derrubaria?
Uma coisa muito comum é colocar sal no sake! Antigamente, quando o sake era mais simples e tinha sabor mais rústico, as pessoas colocavam sal para disfarçar o sabor amargo ou desequilibrado da bebida. Hoje em dia, os sakes “de verdade” têm, cada um tem sua característica organoléptica, e o sal acaba “estragando” os sabores e aromas.

O copinho pequeno de sake não é copinho de shot, ele é assim para conservar a temperatura. Até copo de cerveja é menor também, assim, a garrafa fica na temperatura ideal e vai colocando aos poucos no copo.

FM – Então, qual seria o copo ideal para tomar sake?
CI – Na verdade, o copo ideal para sake hoje em dia é uma taça chamada tulipa. Esse copo foi desenvolvido no Japão, mas devido ao preço e a dificuldade de encontrar, o ideal seriam taças de vinhos. Preferencialmente de vinho branco, pois já foi feito todo um estudo para valorizar as características da bebida.

FM – E aquele famoso copinho quadrado?
CI – O “copo quadrado” é chamado de massu e nunca foi um copo de verdade. Há mais de mil anos, não existia balança para pesar o arroz, então quando o camponês vendia o arroz, o massu era um copo de medida para saber quanto de arroz está sendo vendido. Como o camponês era uma pessoa humilde, ele aproveitava o massu para consumir o sake. Na época, o sake era um alimento, então o arroz era cozido e através da saliva ele fermentava e formava um “mingau” alcoólico de arroz que era comido no massu.

Como no Japão tudo tem um simbolismo, o massu se tornou um símbolo para homenagear o camponês humilde que inventou o sake milhares de anos atrás. O massu é, hoje, mais utilizado para brindes, festas, onde, no momento de felicidade e comemoração, você está homenageando esse camponês.

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