Já imaginou um único lugar reunindo vários produtos amazônicos de origem responsável e despachando para todo o Brasil? Prazer, Manioca. 

Jambu, tucupi, cumaru, puxuri… Se você é aficionado por gastronomia ou até mesmo fã de reality show de culinária, então já ouviu alguns desses nomes, todos típicos da região amazônica. Mas desses, quantos você já teve a oportunidade de provar? Se sua resposta foi zero, relaxa, você não está sozinho, pois não é tarefa fácil encontrar a maioria dos produtos da cozinha do Norte em outras partes do Brasil — o que, convenhamos, é quase um pecado! E foi justamente pensando em suprir esta carência de insumos genuinamente brasileiros que surgiu a Manioca, empresa paraense que tem como proposta derrubar qualquer barreira que impeça o avanço dos sabores e saberes da Amazônia.

Encurtando distâncias

Joanna Martins conta que o embrião de sua empresa nasceu da inquietação e incômodo que ela sentiu ao perceber o quão distante o Brasil era da Amazônia, ao morar por cinco anos em São Paulo (1998 a 2002), onde cursou faculdade.

“Era bem doloroso notar o quanto a culinária da minha região era exótica para os paulistas e para as pessoas de outros estados fora do Norte”, relembra.

Não sem motivo, ao voltar para Belém, Joanna levou em sua mala todo incômodo que sentia e, após dois anos matutando e atuando em outras áreas, encontrou na indústria de alimentos uma forma de atuar efetivamente para mudar essa realidade, aliando, ainda, a oportunidade de valorizar a cultura do povo local e gerar desenvolvimento sustentável e renda na sua terra. 

Contudo, antes de prosseguir, é importante ressaltar que a conexão da Joanna com a comida não surgiu da noite para o dia, mas anteriormente ao seu nascimento.

Em 1972, sua família abriu as portas do “Lá em Casa”, em Belém, restaurante dedicado à cozinha regional, que tão pronto passou a ser um grande divulgador dos sabores da floresta amazônica. No decorrer do tempo, seu pai, o chef Paulo Martins, percebeu que poderia usar na cozinha toda sua criatividade de arquiteto e começou a mesclar os insumos regionais com técnicas internacionais, o que resultou em convites para ministrar aulas por todo o Brasil. 

Muito prazer, Pará

Após muito viajar, Paulo Martins criou, no ano 2000, o Festival Ver-o-Peso da Cozinha Paraense, com o objetivo de levar à capital do Pará chefs, jornalistas e entusiastas para conhecerem mais afundo a cultura alimentar daquela região, fazendo com que ele ficasse conhecido como Embaixador da Cozinha Paraense, pois foi o responsável por apresentar esses ingredientes para uma grande parte do meio gastronômico brasileiro. O  interesse pelos produtos amazônicos estava em crescimento.

A partir de todo esse trabalho de divulgação, começou a surgir uma demanda natural, por parte de chefs de cozinha, pelas especiarias da Amazônia, e Paulo começou a fornecê-las quase que como um favor. 

Em 2010, depois de se formar em Publicidade e atuar na área por quase uma década, Joanna começou a trabalhar na gestão do “Lá em Casa”, e, de perto, viu essa demanda ir aumentando cada vez mais. Então, analisando e somando a conjuntura do cenário gastronômico nacional, o aumento do preço de produtos importados, a gastronomia virando hobby e a inquietação de outrora, percebeu a oportunidade de lançar uma marca de produtos que oferecesse o que sua terra tinha de melhor.

Em 2014, nasce a Manioca

Dois anos mais tarde, o bacharel em Direito Paulo Reis, que já havia atuado em vários projetos de desenvolvimento com comunidades ribeirinhas, e que havia conhecido a Manioca em um projeto de sua faculdade, engajou-se no negócio, tornando-se sócio e abraçando essa história ao lado de Joanna, potencializando, gerindo, pensando e liderando um grande time para tornar a Manioca realidade e presente em todo território nacional. 

De início, os fornecedores foram aqueles que Joanna herdou do restaurante de sua família, que, naturalmente, já eram pequenos produtores ou extrativistas de povos e comunidades tradicionais que forneciam produtos de muita qualidade.

“E o que hoje fazemos é apenas seguir esse princípio, agregando ao longo do tempo apoio ao desenvolvimento deles, a partir da criação do Programa Raízes, que atua diretamente em 37 famílias, com capacitação, assistência técnica, apoio à formalização e monitoramento do impacto ambiental, de forma sistematizada, com metas de melhorias, avaliação de resultados e crescimento”, conta Joanna, que acredita ser este o grande diferencial de sua empresa. “Queremos que tudo que fazemos não seja bom só para a gente, sócios ou funcionários, mas também para região em sua totalidade e seu povo”, ressalta. 

Equipe Manioca | Foto: divulgação

Desenvolvimento x desmatamento

Joanna costuma dizer que cresceu injuriada com as matérias que criticavam o desenvolvimento da Amazônia em detrimento do desmatamento, e sempre se questionava: “o mundo se destruiu e agora não quer deixar a gente se desenvolver porque vai destruir a floresta? Isso não é justo”.

Mas ao criar a Manioca, ela entendeu que é possível, sim, desenvolver sem destruir a floresta, desde que o modelo seja alterado, que saia da ideia da grande indústria que visa o mercado a qualquer custo, para um modelo de negócio diferente, que valoriza os insumos e o conhecimento do seu povo, integrando valor a eles e respeitando o meio ambiente. 

Quanto ao impacto sócio-cultural ao firmar parcerias com produtores locais de produtos amazônicos, Joanna diz enxergar que a ação dá-se de forma natural.

“Vivemos numa região com pouquíssimas oportunidades de geração de renda. Apesar de, a partir do nosso ponto de vista, não faltar qualidade de vida na região, quando olhamos sob a ótica global, nosso povo carece de muitas coisas básicas, como saúde, educação, transporte, energia. E tudo isso, quando se tem uma economia girando, fica mais fácil de se obter. Acreditamos que ao valorizar, difundir e incentivar a geração de produtos e ingredientes da região, aliados à cultura local de forma responsável, estamos atuando diretamente na geração de renda, desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida de quem mora aqui”. 

Os carros-chefe

Tucupi Amarelo Manioca, produto premiado na França | Imagem: divulgação

Hoje, os dois principais produtos amazônicos da Manioca são o tucupi amarelo e a granola de tapioca com especiarias — lê-se cumaru, cupuaçu, nibs de cacau e castanha do Pará. São produtos que representam o caminho que a empresa da Joanna adotou ao pensar em ingredientes para o mercado brasileiro.

O primeiro é um produto tradicionalíssimo da região Norte, feito a partir da mandioca, ingrediente ancestral brasileiro, e cujo processo de produção mantém-se praticamente o mesmo há séculos, desde os povos originários.

“Com a influência dos portugueses, houve a inclusão de temperos de outras regiões do mundo, e o tucupi se transformou em um sabor único e muito especial, que funciona como um tempero incrível para (quase) tudo”, explica Joanna. E a tapioca foi uma forma que a empresária encontrou de incluir a riqueza da floresta em produtos corriqueiros e consumidos por pessoas que buscam uma alimentação mais natural e saudável. 

“Maravilhoso e, por vezes, indescritível”, é como Joanna resume o sentimento em saber que está compartilhando conhecimento, respeito e tradição junto com sua marca. “Entendemos que o que fazemos aqui é aproximar, apresentar, conectar e traduzir a Amazônia para o Brasil”, observa ela. 

Espalhando os sabores amazônicos

Ao ver um consumidor do interior do Rio Grande do Sul, de uma capital do nordeste ou mesmo de uma família francesa adquirindo e conhecendo algo por meio da Manioca, e que antes nunca havia ouvido falar de um produto da culinária da Amazônia ou que desconhecia a potência da biodiversidade da mesma região, é quando Joanna se sente mais motivada em seguir em frente, tarefa que, segundo ela, “não é simples e tampouco fácil, mas que vale muito a pena”. 

Antes de iniciar minha conversa com Joanna, eu estava na minha casa, em São Simão, cidade do interior de São Paulo com pouco mais de treze mil habitantes, e na bancada da minha cozinha havia uma garrafa linda de tucupi amarelo Manioca à minha espera — iria preparar uma moqueca —, e isso me chamou atenção.

Como que um produto lá de Belém veio parar na minha cozinha, nesse pontinho do mapa? Óbvio que tive que perguntar para a Joanna como ela se sentia em relação a isso, pois, para mim, algo sair da Amazônia e chegar em uma cozinha de São Simão, SP, beira o surreal. Aos risos, ela diz que “isso apenas mostra que, o que no começo parecia ser só um sonho, começa a se tornar realidade”. 

O desafio da geografia para os produtos amazônicos

E por falar em distância, mesmo com o trabalho de exportação ainda não sendo uma das prioridades da marca, ao longo dos últimos anos a Manioca tem conseguido estabelecer parcerias sólidas e crescentes em mercados internacionais como França, Japão e Estados Unidos.

“Para fora do Brasil o que mais vendemos é tucupi e as farinhas de mandioca (a granulada de tapioca e a fermentada de mandioca). Por serem produtos mais tradicionais e alinhados à cultura amazônica, é o que gera mais interesse em quem procura pelo nosso trabalho lá fora”, revela Joanna. 

Mas se entre os gringos e os brasileiros fora d’Amazônia o tucupi reina soberano, entre o time interno da Manioca a história é um pouco diferente. Nos corredores da empresa os queridinhos são o cumaru e o molho de tucupi preto.

Se você me acompanha nas redes, sabe que eu tenho verdadeira adoração por cumaru, semente cujos sabor e perfume lembram os da caríssima baunilha. Quanto ao tucupi preto, trata-se de uma variante do tucupi amarelo, que passa por um processo de redução que pode levar muito tempo, alterando sua cor e sabor, que lembra o shoyu, só que mil vezes melhor. 

Presentes em restaurantes renomados e em programas de TV famosos, todos produtos da Manioca podem ser encontrados no site da empresa. E para a alegria de todos os amantes da cozinha, eles enviam para todos os cantos do Brasil. Se chegou em São Simão, meus caros, imagina onde pode chegar!

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