A cerveja que está na moda

A cerveja que está na moda

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Roupas em uma vidrine. Foto: Annah Morgan via UnsplashRoupas em uma vidrine. Foto: Annah Morgan via Unsplash

Quando pensei em escrever um texto sobre o que seria uma “moda” cervejeira, resolvi dar uma leve pesquisada no termo “moda”. Cheguei a me perder, confesso. Passei algumas horas tentando acompanhar tudo o que mudou em relação a comportamento, costumes e o que isso gerou para cada época onde o termo estava vivo. Moda tem tudo a ver com criar estilos. Olha que coincidência.

Nós bebemos cerveja faz milênios. Não é uma moda, é um modus de vida. Contamos a história da Mesopotâmia, falamos sobre a cerâmica como tecnologia da época. Seguimos tentando explicar como uma bebida sobreviveu ano a ano, século a século e milênios depois ainda falamos sobre inovação, moda, tendências e mudanças sensoriais. Cerveja, assim como a moda é uma forma de arte. Nos movemos em direção a um maior êxtase.

Quando os humanos começaram a se vestir, usavam peles, fibras e elementos simples, colhidos no ambiente. Milênios depois, o colonizador europeu não conseguia enxergar as pinturas dos corpos, as cores e adereços como forma de vestimenta de determinadas culturas. Forçou uma mudança nesses locais que eram diferentes. Saímos da nudez como condição e fomos para a nudez como escolha estética, cultuada, depreciada. As vestimentas ajudaram a criar uma diferenciação social, e usaram de elementos como cor, qualidade do tecido, padronagens e adornos.

O que chamamos hoje de estilos cervejeiros, são receitas com origem e história, mas que também mudaram ao longo do tempo. Conforme mudou o entendimento, evoluiu a técnica e a tecnologia, mudaram os sabores. O fenômeno sociocultural da cerveja também expressa os valores da sua época, conforme as roupas e costumes. E os gostos fazem parte de um sistema complexo e estético a ser debatido.

Uma cerveja que hoje em dia leva baunilha, ingrediente caro e intenso, pode ser comparada a uma roupa de cor púrpura de determinada época, onde o pigmento era raro e exclusivo? Ambos os elementos trazem um valor imensurável. Pois tem valor para quem? Apenas para quem entende o que é aquilo como significado.

Assim, a moda se desenvolve em comunidades, pode ser artesanal e exótica, para poucos, ou leve, clara, flat, fácil para muitos. Consegue enxergar as similaridades?

Uma cerveja que está na moda, pode ser uma Pastry Sour IPA com amora e goiabas, dois tipos de baunilha, lactose e bolacha champagne, além dos ingredientes de base que compõe aquilo que é conhecido por cerveja? Seria a NEIPA o novo Tweed? Com um toque de acidez, seria um Yves Saint Laurent? Se for muito tropical a receita podemos pensar em Carmem Miranda? Eu adoro brincar com essas associações e tentar entender o papel que cada categoria cumpre, nessa linha do tempo.

Museu Yves Saint Laurent em Marrakech (foto divulgação)

Acompanhar a história da moda é também entender que existem vestimentas e culturas além das revistas e Tv. O extremo oriente, o continente africano, os países asiáticos desenvolveram suas próprias modas e padrões. Hoje, com a tecnologia e logística, podemos experimentar aquilo que antes era desconhecido. Novas texturas, novos adendos. Chegou o momento de nos entrelaçar e vivenciar a experiência de uma cultura nova, com a perspectiva única e o respeito por aquela jornada. E podemos dizer o mesmo quando falamos de sabor.

O termo moda parece que surge a partir do século XIX, como a conhecemos. Esses conceitos mais organizados, com profissionais dentro do que se chamaria mercado é a revolução Industrial e mudou todos os setores, costumes e comportamentos. Assim como a cerveja, as roupas se transformaram em main stream, com poucas variedades. E uma pasteurização estética da sociedade.

Há muito a ser dito sobre esses dois objetos de estudos e como de tempos em tempos as coisas podem ter os mesmos nomes, mas mudam as apresentações. Um sapato é algo de se colocar no pé, mas ganha um salto ou um solado emborrachado, vira um chinelo de dedo para muitos ou se for um solado vermelho um Louboutin para poucos.

Aquele vestido, o “pretinho básico” e que segundo cultura popular “nunca sai de moda” é a geladeira atual, com cervejas leves, lights, lagers, sessions. Nos sentimos seguros em ter algo que sabemos como é, sem ousadias, sem cansar a vista ou o paladar. A também conhecida dupla jeans e camiseta traz conforto e comodidade. Mas o que parece antigo, é também supernovo. Os vestidos e o jeans, estão apenas algumas décadas para trás de nós. Não era assim um milênio atrás.

Uma cerveja muito fora do que consideramos hoje tradicional e que usa ingredientes incomuns, pode nos parecer uma moda desconhecida ou muito ousada, mas o topete do James Dean na década de 50, mostrou que a moda pode ser medida pelo seu sucesso em diversas formas. Um tecido brilhante pode ser usado em uma pista de dança, um cetim tem seu valor e a seda sempre terá um caimento perfeito. Quem tem o perfil mais hippies e suas cores alegres e floridas, anos mais tarde pode ser que prefira tecidos mais leves e de cor crua. A moda é passageira, com ou sem retrogosto. Um pouco mais punk, um pouco mais blazer com ombreira.

Atualmente parece que a moda tem a liberdade que quiser, faz o revival de outras épocas, mas pensa que a customização é possível para cada comunidade e o mais importante é pensar em reciclagem e como ter um desenvolvimento mais sustentável.

Assim o mercado cervejeiro também é com suas modas, seus cortes, acidificações, maturações, centrifugações. Fazendo diferentes cores, com roupagem diferente em cada embalagem, com topetes em forma de adjunto e joias frutadas e lapidadas.

Cada um sabe sobre seu sapato e seus calos. Hoje a moda sensorial é plural, olha para tendências, desenha sua própria roda de sabores e cores. Beba a cerveja da moda, aquela que veste melhor no seu paladar. Corte a franja, passe gel no topete, abra uma cerveja com mais turbidez, prove algo mais frutado. Não é todo dia que se fantasia para uma festa e não é sempre que precisamos estar de jeans e camiseta.

* Esse texto nasceu depois que eu provei as cervejas Dserve, da linha da Ux Brew, lançadas em agosto/2020. Fui influenciada por esta nova moda de romantizar estilos com ingredientes um pouco mais exóticos 😉

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